Alma Patre


Tu no teu mundo e eu no meu.
Isso e muitas mais coisas em comum.
Ambos sonhadores.

Eles levaram-te como me levarão a mim.
Agora o deserto.
O deserto em mim presente.
Rio para não chorar.
Mas rios de lágrimas já os percorri.
Já não tenho lágrimas.
Já não sinto.

A vida que me traiu desde o primeiro dia.
Ou talvez tenha sido eu quem não quis abrir os olhos.
Sempre gostei de viver no meu mundo, deveras melhor do que o dos homens comuns.
Talvez tenha sido eu que não esperasse um adeus tão jovem,
Um adeus que ficou por dizer,
Ou um abraço, um beijo, uma frase.

Quem me chama de forte não sabe nada de mim.
Sou fraco, tão fraco.
Mais enfraquecido fiquei.
Mas minto bem, pareço normal.
Pareço aquilo que a sociedade pede.
Pareço racional, com força, forte.
Mas é tudo mentira.
Sinto-me perdido, a afundar.
A amargurar um coração que não te deixou de amar
Já estou seco.

A minha vida sem leis
Porquê leis?
Eles não nos vêm buscar à mesma, com ou sem leis?
Ás vezes gostava que fosse já o meu dia.
Ás vezes gostava de adormecer nesse mar sem ondas,
Nesse pântano sem ruídos.

Falso, o mundo à minha volta.
As pessoas, as rotinas, as coisas todas.
Tudo falso.
Escape talvez.
Espero por ti mas tu nunca mais chegas.
Faço os outros rirem para os manter ocupados,
Porque quando rimos esquecemos,
E eu quero ser esquecido,
Deixado de parte,
Mas eu já nem sei o que quero.

Trouxeste contigo uma dúvida tão grande.
Finjo ainda ter interesses, finjo ainda encaixar no sistema.
Mas vejo agora que nunca fiz parte do mesmo.
Lunático, perdido, sozinho.
Fechado no meu mundo.
Um grito de socorro se eu quisesse ser socorrido
Mas nada que não ilusões, futilidades ou superficialidades
Para me encherem de vazio.

Só nos meus sonhos,
Já só nos meus sonhos te tenho comigo.
Nós a pescarmos. Não que qualquer um de nós goste de pescar.
Mas pescar é o melhor engodo para uma conversa profunda entre dois homens.
A solidão de dois seres, o mar como tela e uma cana de pesca para simular um acto mundano.
Nós a falarmos. Conversas fáceis. Algumas menos fáceis.
As tuas histórias. Histórias sobre os erros que cometeste.
Sobre os feitos que alcançaste.
Caminhos onde devo pisar os teus trilhos.
E caminhos que devo desprezar.
Agora, se quiser pescar, terei que o fazer só,
Qual criança ingénua.

Nó da gravata aprendido.
Várias coisas aprendidas.
Todos os dias, o teu olhar nos olhos de outros,
As tuas palavras nas bocas de outros.
Chega-te a mim um dia destes para falarmos e talvez, irmos à pesca.
Desta vez estás mais demorado do que o costume.
Mas depressa chegarás, tenho a certeza.

2 comentários:

scatterbrain disse...

"There are some fish that cannot be caught. It's not that they're faster or stronger than other fish. They're just touched by something extra." - Big Fish.

H. disse...

Bem dito, Inês! Obrigado pelo comentário, mais uma vez! ;)